Por Tamara da
Silva - Advogada
Poucas sociedades passaram, nas últimas décadas, por tão profundas e
rápidas transformações como a sociedade brasileira. Porém, mesmo tendo passado
por essas transformações, nossa sociedade ainda apresenta velhos problemas que
permanecem cada vez mais vivos. Um deles é a questão das precárias
possibilidades de acesso dos afro-descendentes às oportunidades de mobilidade
social.
Os
baixos índices de afro-descendentes que conseguem chegar às universidades e dar
seqüência aos seus estudos, a desproporcionalidade de renda que mantém esse
grupo de pessoas nas camadas inferiores da pirâmide social e toda sorte de
discriminação em função da cor da pele e não em razão de suas capacidades, são
indicativos disso.
Essa realidade é visível nos bancos escolares, nas empresas e
no Estado, onde o fato do poder político concentra-se nas mãos de uma minoria o
que agrava ainda mais a situação de injustiça social e de tolhimento do
exercício da cidadania.
Para se contrapor a essa discriminação surge um movimento no
meio da sociedade que busca resgatar a dignidade daqueles que foram alijados da
possibilidade de ascensão social por causa da cor da sua pele um movimento que luta por política de cotas para
afro-descendentes a partir da reivindicação de acesso às universidades e em
concursos públicos.
Atualmente, temos uma lei que
reserva vagas, mediante cotas em universidades e alguns concursos públicos,
contudo o racismo no Brasil se apresenta como um dos grandes desafios a serem
superados pela população negra, já que esta condição, acrescida da distribuição
injusta da riqueza e dos inúmeros benefícios gerados pela política econômica à
classe dominante, notadamente “branca”, relegam a grande maioria negra a
condições extremamente precárias de sobrevivência.
Acredito que a luta política pela igualdade entre negros e “brancos” não
está desconectada da luta pelo fim de uma sociedade que tende a homogeneizar
culturas, hierarquizar e coisificar as relações entre as pessoas que, em última
instância, estão condenadas a serem reduzidas simultaneamente a consumidores e
mercadorias.
Assim sendo, entendo que para
que homens e mulheres sejam humanamente emancipados de fato– já que a
emancipação política já ocorreu pelo menos na teoria– e assim tenham todos as
mesmas condições de desenvolver suas potencialidades e uma autêntica
individualidade, se faz necessário, antes de tudo, repensar radicalmente este
modelo de organização da vida econômica, social e política.
Na luta pelo seu espaço, a conquista de política de cotas
dá-se em 2001, ano em que foi introduzida pela primeira vez no Brasil, sendo
adotada pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Em 2002, a governadora
daquele estado, Benedita da Silva (afro-descendente), regulamentou a lei das
cotas, dando, a partir daquele momento, o início oficial do sistema de cotas
para afro-descendentes em universidades brasileiras. Mas a minha pergunta é
justamente essa, será que as cotas resolveram o nosso problema? Será que essa
não é mais uma forma de discriminar aqueles que tanto sofreram? Existem relatos
de jovens que são discriminados dentro das universidades e repartições públicas
por ocuparem vagas oriundas de cotas raciais, ou seja, o problema se agrava ao
invés de igualar as pessoas.
Entendo que a política correta a
ser feita seria um trabalho nos bancos escolares, através de uma boa educação,
suporte, cursos de qualificação e pré-vestibulares para que os
afro-descendentes e todas as demais etnias pudessem ter uma boa formação e
participarem dos concursos de igual para
igual sem exatamente a necessidade de cotas raciais.
Quando recebi o convite para fazer
parte da comissão da OAB/PR de igualdade e gênero, confesso que fiquei com
receio, pois as pessoas sempre tendem a levar as coisas para o outro lado, mas
acredito que já está mais do que na hora de tomarmos a frente de nossas causas
e lutas. Para mim que sou afro-descendente, oriunda das camadas pobres da
população é mais do que um prazer um dever meu para com a sociedade
afro-descendente fazer frente dessas lutas para acabar com o racismo e a
desigualdade em nossa sociedade e mostrar sim nos somos tão competentes quanto
qualquer outra pessoa, merecemos e queremos respeito, e as cotas não são
nenhuma caridade por inferioridade é uma questão de amenizar as desigualdade e
bem verdade que se houvesse um programa social de melhora na educação e nas
estruturas de bases, não haveria o porque das cotas.
Dra. Tamara da Silva é advogada e Membro da Comissão da Igualdade
Racial e Gênero da OAB/PR
Nenhum comentário:
Postar um comentário