A adoção de cotas raciais pelas
universidades brasileiras responde a uma demanda histórica da população negra
por políticas de equidade racial, ampliando a democratização do acesso ao
ensino superior
Letícia Peçanha, Blogueiras Negras
É de uma desonestidade intelectual tremenda
querer discutir cientificamente sobre as cotas e a existência das raças, como
se uma porcentagem de genes definisse quem é negro. Uma pessoa que tem mais da
metade de genes de origem caucasiana-européia, mas, ainda sim, manifesta
fenótipos negros, terá sobre si o peso do racismo. Ninguém precisa fazer um
exame de DNA em mim pra saber que eu sou negra. Esse papo de herança genética,
de não existência de raças, é, pra mim, enfurecedor. Tamanha falácia.
Acho engraçado também quando eu escuto
a imensa preocupação com possíveis fraudes na autodeclaração. Para negar
direitos ao povo negro, a autodeclaração é tornada um óbice… Mas ser declarado
negro por essa sociedade, ser marginalizado, preso, exterminado, não é problema
nenhum. As cotas nas penitenciárias andam a pleno vapor e ninguém se importa
com a fraude que é esse sistema perverso e racista. Quanta hipocrisia.
Ah, mas e as cotas sociais e os brancos
pobres? Nós estamos aqui falando de séculos de exclusão e marginalização da
população NEGRA. Chega de falar de branco! Estamos falando de mais da metade da
população desse país sendo excluída da universidade e ainda ousam questionar a
injustiça que é alguns dos brancos não terem acesso à universidade? Nós somos
maioria na população e minoria na universidade e ainda temos que ficar pedindo
licença pra entrar? Chega! Já deu!
Estamos falando de uma meritocracia
fajuta, que exclui mais sistematicamente pessoas negras da universidade. Não há
que se falar em mérito quando as oportunidades são desiguais. Você, branco, com
seu pré-vestibular maravilhoso, com curso de inglês, francês, intercâmbio,
competindo com um cara que mal tinha uma carteira pra sentar, que dirá um
professor.
Eu estou falando de reconhecimento. EU
estou falando de andar nos corredores da faculdade de Direito da UERJ e olhar
os quadros com as fotos dos formandos antes das cotas e ver, no máximo, um
negro pingado nas fotos. EU estou falando de nunca ter tido uma professora
negra. Estou falando de andar no fórum onde trabalho e só encontrar meus iguais
com o uniforme de terceirizado, trabalhando na limpeza, no elevador ou de
segurança. Aliás, por isso, sou a favor de cotas não só na universidade, como
no serviço público.
Já perdi a conta das vezes que debati
essa questão. E já vi que vou passar muitos anos da minha vida ainda tendo que
debater. Paciência!
“Acima de tudo, não iremos nos calar
diante de qualquer ataque aos nossos direitos.”
Folha, eu discordo de você e não te
sigo! Cotas sim!
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